A Inteligência Artificial (IA) está alterando a forma como nós advogados trabalhamos e como somos reconhecidos pelos clientes. Ao separar o hype dos fatos, uma constatação se impõe. Há muito investimento, muitas empresas criando produtos, e muita gente usando IA com resultados surpreendentes, para não levarmos a sério o momento de mudanças estruturais que o setor jurídico está experimentando.
Este 11 de agosto, Dia do Advogado, apresenta um cenário de profunda transformação nas atividades jurídicas impulsionada pela acelerada adoção de Inteligência Artificial. Relatório global da Liquid Legal Institute, indica que atualmente 82% dos escritórios de advocacia e departamentos jurídicos utilizam alguma ferramenta de IA. Há dois anos, quando surgiu o ChatGPT, o percentual era de 50%. A curva de adoção se intensificou.
O futuro está chegando. E rápido
No Brasil estamos no momento de usar IA para o aumento de eficiências pontuais nas atividades jurídicas. No contencioso massificado, um objetivo comum é a redução de custos em tarefas repetitivas. Por outro lado, no consultivo, a diminuição de tempo gasto na gestão de contratos. Mas, a mudança do cenário não vai ficar apenas na oferta de micro eficiências para a advocacia.
Fora do país, departamentos jurídicos de grandes empresas pressionam pelo fim da cobrança por hora de trabalho. Recentemente, como head de Novos Negócios, estive pela Preâmbulo Tech na Legal Tech Talks, a maior conferência de tecnologia e direito do Reino Unidos, em Londres. Em alguns painéis, diretores jurídicos de grandes companhias foram bastante assertivos em afirmar que não querem pagar por tarefas repetitivas ou de baixa complexidade. Outros foram ainda mais diretos, ao dizerem que não querem mais pagar por atividades realizadas por advogados juniores. Por outro lado, afirmam que pagam de bom grado honorários vultuosos para serviços que apresentem alto valor estratégico.
Essa percepção já ocorre em terras brasileiras e tende a se tornar uma exigência corrente no meio empresarial. Em consequência, gera novas necessidades para a advocacia. Não somente para as grandes firmas, que já vêm incorporando tecnologia em seus processos de trabalho, mas também para os médios e pequenos escritórios. Por uma questão de sobrevivência e dada a dinâmica pujante do mercado brasileiro de softwares jurídicos, há uma tendência de que passemos para uma nova onda de adoção de IA.
Da eficiência ao valor estratégico
O aumento da eficiência da operação jurídica e a redução de tempo na execução de tarefas estão virando commodities. Estamos começando a era em que a tecnologia faz parte da entrega de valor estratégico aos clientes.
Muito além do foco na redução das tarefas repetitivas, o desenvolvimento de tecnologias está se direcionando para criar aplicações que oferecem alto potencial de entrega de valor. Novos e sofisticados usos de jurimetria preditiva, aplicadas para casos concretos, ferramentas de análise jurídica avançada, gestão de carteiras de processos, gestão inteligente de riscos. Há todo um mundo novo a ser explorado.
Sobretudo, a IA está ampliando sua relevância para escritórios e departamentos jurídicos, deixando de ser uma mera redutora de custos para se tornar uma promotora de valor estratégico. Além disso, existe uma nova mentalidade sobre o papel da tecnologia no setor jurídico se impondo. Há empresas de tecnologia bastante conectadas ao mercado, capazes e dispostas a dar respostas surpreendentes às novas necessidades. É a conjuntura perfeita para uma tempestade de mudanças aceleradas, que devem resultar em efeitos disruptivos no mercado jurídico.

Do fazedor de documentos ao conselheiro estratégico
A principal ruptura que provavelmente o setor irá vivenciar é a de um “retorno às origens” da profissão. Nas últimas duas décadas uma crença comum se cristalizou. O advogado produtivo era aquele que mais elaborava documentos. Quanto mais textos produzidos, melhor era o profissional. A produtividade era medida em kbytes de texto. Esse mundo está ficando para trás.
O advogado produtivo será cada vez mais aquele que entregar alto valor estratégico ao cliente. Dessa maneira, será aquele que apresentar os melhores aconselhamentos jurídicos, muito conectados à percepção do valor esperado pelos seus clientes. O advogado como conselheiro jurídico está de volta.
Nesse contexto, é imprescindível saber avaliar riscos com base em uma visão de risco fundamentada nas decisões dos tribunais e nas metodologias avançadas de gestão de cenários, algo corriqueiro em áreas como direito ambiental, proteção de dados e compliance de IA.
É claro que existem profissionais que há décadas trabalham dessa forma. Mas, mesmo para eles, a lógica irá mudar. Porque agora serão conselheiros jurídicos “com esteróides”. Poderão anabolizar sua prática jurídica com o uso de sistemas de IA especializados.
Mudança de modelo de negócio
Os modelos de negócios tendem a migrar rapidamente para sistemas de precificação baseados em valor, e não mais em horas faturáveis, incentivando advogados a concentrarem-se em tarefas de alto valor agregado.
Essa mudança reflete uma demanda crescente dos clientes por maior previsibilidade nos custos e uma clara percepção do valor agregado entregue pelos serviços jurídicos. Por consequência, os advogados serão incentivados a focar em tarefas mais estratégicas e complexas, que requerem expertise profunda, criatividade, e julgamento sofisticado. A tecnologia conduz o advogado para áreas em que a contribuição humana é insubstituível e onde o valor percebido pelo cliente é significativamente maior.

Transformação cultural
A transformação digital na advocacia não é apenas tecnológica, mas fundamentalmente cultural e humana. Assim, requer lideranças capazes de promover uma cultura de inovação contínua, apoiando equipes em processos constantes de aprendizagem e adaptação. Ferramentas como agentes de IA, que colaboram autonomamente em tarefas complexas e plataformas avançadas para resolução online de disputas, já são realidade.
Este novo cenário jurídico requer advogados preparados para abraçar a curiosidade, a inovação e a ética como pilares essenciais da profissão. O futuro da advocacia requer dinamismo, colaboração e interação humana.
Aprendizagem na velocidade da luz
A mudança do contexto tecnológico e na percepção de valor dos clientes vai impactar nas habilidades necessárias para o exercício da profissão. Ter conhecimento jurídico elevado será cada vez mais um requisito mínimo para sobreviver no mercado.
Com o setor jurídico caminhando para novas exigências, os advogados iniciantes precisarão criar meios para se tornarem advogados plenos mais rápido se quiserem sobreviver a um mercado altamente competitivo. Não se trata de adquirir as chamadas soft skills, embora isso seja desejável.
Trata-se de entender com profundidade, e na prática, o funcionamento dos tribunais, a lógica do peticionamento, a estratégia processual, para cada nicho de mercado. Trata-se, entre outras coisas, de entender a complexidade das operações dos clientes, a fim de poderem apoiá-los em questões consultivas de forma estratégica.
De forma mais geral, atualmente há a percepção que advogados de sucesso, no futuro próximo, tendem a atuar como profissionais estratégicos, com habilidades de uso de tecnologias. Além disso, deverão ser uma espécie de artífices jurídicos dotados de pensamento criativo, inteligência emocional e capacidade excepcional para relacionamentos e desenvolvimento de negócios.
Como essas habilidades são pouco ensinadas e pouco aprendidas, há uma jornada de aprendizagem ampla a ser trilhada por aqueles que desejam permanecer relevantes no setor jurídico.

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O que a IA exige de você como advogado a partir de agora
A advocacia está atravessando uma mudança de paradigma. A inteligência artificial não é mais uma promessa futura — ela já molda o presente da profissão.
O advogado que quiser manter sua relevância não poderá se apoiar apenas no conhecimento jurídico. Será necessário adotar uma postura estratégica, dominando tecnologias, entregando valor com criatividade e atuando como conselheiro de confiança para seus clientes. O futuro da advocacia exige muito mais do que apenas saber peticionar.

FAQ: Dúvidas sobre Inteligência Artificial na advocacia
A IA está otimizando tarefas repetitivas, reduzindo custos e permitindo que advogados foquem em atividades estratégicas e consultivas.
Pensamento estratégico, domínio de ferramentas tecnológicas, análise de risco, criatividade e capacidade de relacionamento com clientes.
Sim. Cada vez mais, empresas e departamentos jurídicos buscam modelos de precificação baseados em valor agregado e previsibilidade de custos.
Sim. A competitividade do setor exige que até mesmo os pequenos e médios escritórios adotem ferramentas tecnológicas para se manterem relevantes.
Não, desde que haja transparência, controle humano e compromisso com os princípios éticos. A tecnologia deve ser uma aliada, não um substituto.
Ser advogado vai além de conhecer as leis e estratégias judiciais. Neste cenário, a tecnologia tem transformado a forma como é feita a condução de pesquisas, gerenciamento de documentos e a comunicação com clientes.